“Autoridade ou autoritarismo? A linha que eu quase não vi”
- Daniela Scotti

- 18 de nov.
- 2 min de leitura

Quando eu era criança, a escola era um lugar onde se falava baixo. Onde o medo caminhava entre as carteiras. Onde muitos professores falavam alto, e os alunos engoliam a dúvida, o erro, a vontade de perguntar.
Me lembro de giz voando. De olhos que evitavam encarar. De colegas constrangidos em frente à lousa.
Naquela época, confundia-se respeito com silêncio. E autoridade com autoritarismo.
Mais tarde, já no curso de Educação Física, encontrei o mesmo padrão — agora em outra roupagem. No mundo dos esportes, da competição, dos treinadores que exigiam obediência, disciplina, perfeição.
Não estou generalizando — conheci professores incríveis. Mas era visível: o grito muitas vezes vinha antes da escuta. O erro era punido antes de ser compreendido.
Quando comecei a dar aula, levei comigo muito do que vivi. Sem perceber, reproduzia. Corrigia com dureza. Queria tudo no tempo certo, na forma certa. E, na sala de dança, isso virava rigidez.
As meninas dançavam perfeitamente. Enfileiradas. Conectadas. Um espetáculo visual. E os elogios vinham: — Olha só, seu exército de sapateadoras!
Mas aquilo me incomodava. Exército? Eu não queria formar soldadas. Queria formar gente.
Comecei a me observar. A questionar os tons de voz, os gestos, o jeito de conduzir. Comecei a perceber que perfeição demais, às vezes, escondia medo. Que o silêncio em sala nem sempre era sinal de concentração — mas de contenção.
Aos poucos, fui trocando o comando pela conversa. O olhar duro pela escuta. O passo impecável pela presença real.
E entendi, no processo, a diferença entre autoridade e autoritarismo.
Autoritarismo impõe. Autoridade inspira.
Autoritarismo cala. Autoridade abre espaço.
Autoritarismo se sustenta no medo. Autoridade se constrói no vínculo.
Autoridade não precisa levantar a voz. Ela vem do respeito mútuo. Do exemplo. Da firmeza com empatia.
A escola precisa falar sobre isso. Porque não basta dizer que somos afetivos — se, no dia a dia, agimos com dureza desnecessária. Se chamamos a atenção em público. Se exigimos comportamentos perfeitos de crianças que ainda estão aprendendo a viver.
A pergunta que me acompanha hoje é simples, mas poderosa: O que as crianças sentem ao meu lado?
Se é medo, controle, tensão — algo precisa mudar. Mas se é confiança, segurança e liberdade com responsabilidade — então estou no caminho certo.
Não quero mais formar um exército. Quero formar seres livres, conscientes, criativos.
E, para isso, sigo me vigiando. Porque a linha entre autoridade e autoritarismo é fina. E atravessá-la, às vezes, é só uma palavra mal colocada.
Mas voltar — voltar exige escuta. Exige humildade. E exige coragem.



.jpeg)



Comentários