“O que fica é o vínculo”

Nunca foi só sobre dança. Claro, eu ensinava passos. Corrigia ritmos, contava tempos. Mas o que se formava ali não cabia numa coreografia.

Minhas alunas de sapateado começaram comigo ainda pequenas. Aprendiam a bater o pé no tempo certo, a ouvir o som que produziam, a se apresentar sem medo. E, ao mesmo tempo, a gente se reconhecia: nas alegrias do dia, nas inseguranças, nas conversas antes da aula.

Crescemos juntas. Elas acompanharam minha vida — os namoros, as dúvidas, o casamento, a gravidez. Estavam lá. Sempre. Torciam por mim como quem torce por alguém da própria família.

Hoje, os papéis se misturam. Sou eu quem acompanha os casamentos delas, quem vê os filhos chegarem. Elas me escrevem, me mandam fotos, me convidam. O tempo passou, mas o laço ficou.

E isso me faz pensar: Qual é o lugar da relação entre professor e aluno na escola que temos hoje? Nos corredores apressados, nos planejamentos corridos, na cobrança por desempenho, sobrou pouco espaço para a construção de vínculos. Mas é o vínculo que sustenta tudo.

Sem vínculo, não há escuta. Sem escuta, não há confiança. Sem confiança, não há aprendizado que dure.

O conteúdo passa. A nota, o boletim, a ficha de avaliação. Tudo isso se dissolve com o tempo.

Mas a forma como um professor olhou para um aluno, como o acolheu no dia em que chorou, como acreditou nele quando ninguém mais acreditava...isso fica.

Penso em quantos alunos têm seus professores como referência de humanidade — não pelo que ensinaram, mas por como se fizeram presentes. Porque a relação verdadeira atravessa o tempo. Aquela que é feita de escuta, de respeito, de estar junto. Ela cresce. Muda de forma. Mas continua.

Hoje, minhas ex-alunas são mulheres. Algumas mães. Algumas professoras, psicólogas. E carregam algo do que vivemos juntas.

Eu também carrego. Elas me ensinaram a ser uma educadora de verdade.

E é isso que quero dizer a quem me lê: o que transforma a educação não são apenas as metodologias, os planos ou os recursos. É o vínculo. É o encontro. É a relação que se constrói e permanece, mesmo quando a aula já acabou.